Era uma vez um menino chamado Joel que tinha dez anos.
Joel vivia com seu pai e sua mão, que o adoravam. Sua irmã também gostava muito dele e eles brincavam todos os dias até o anoitecer.
Joel ia bem na escola. A professora gostava dele. Muitos colegas também gostavam dele.
Alem disso Joel era actor e desenhista. Já tinha participado de várias peças de teatro na escola e na igreja – e o público adorava o Joel. Seus desenhos – que ele criava do nada – agradavam crianças e adultos. Todo mundo gostava do Joel. Menos ele mesmo. Começando pelo nome: queria ser Jociel, Josel, Micael, Rafael, qualquer outro “el” – menos Joel.
Joel olhava para os outros meninos com admiração. E tentava usar o cabelo de um, o tipo de roupa de outro, falar como um outro falava.
Joel tentava copiar comportamentos até da televisão. Uma vez inventou que adorava insectos. E quis figurinhas de insectos, desenhos de insectos, revistas de insectos.
Um dia, porém, ao ajudar na limpeza da casa o Joel viu um insecto em baixo da cadeira. Frente a frente, cara a cara. Foi uma péssima experiência. Joel saiu correndo. Descobriu que insectos pareciam legais no desenho – mas que ao vivo eles não pareciam nada legais...
Esse era o Joel – que queria ser qualquer pessoa, menos ele mesmo. Mas porquê? – perguntou seu amigo João.
O Joel não sabia dizer. Não tinha resposta para isso. Mas tentava ser todo mundo, ter cara de todo mundo, ser comum.
Os colegas gostavam do Joel como ele era – e ele lá fazendo força pra se transformar... no que ele não era.
Um dia o Joel conseguiu. De tanto tentar agora ele não parecia mais ele mesmo: roupa parecida com um, cabelo parecido com outro, jeito de andar de outro, papo de outro ainda. De estudioso passou a ser bagunceiro. De bom filho passou a ser desobediente.
O Joel tinha absorvido um pouco de cada pessoa e montado um novo Joel. Um tanto Frankstein, com um pedaço de um, um pedaço de outro, pedaços diferentes de pessoas diferentes. E achou que assim seria popular, assim todos o notariam, todos gostariam dele. Mudou até seu nome para Jorel.
Aconteceu o contrário: os amigos foram se afastando dele. E o Jorel foi ficando sozinho, cada vez mais sozinho. E cada vez sem entender mais nada.
Mas porquê? Por que ele não fazia sucesso com as meninas? Por que ele não era popular? Ele pensava nisso o tempo todo. Um dia ficou ali amuado, num canto do recreio, triste de dar pena. E seu antigo amigo – o João – se aproximou dele. Chegou e sentou do lado do Jorel.
E conversaram. E o Jorel explicou tudo que fez para ser igual a todos, pra ser popular, para que todos gostassem dele. Daí o João explicou:
- Você era diferente, Joel. E todo mundo gostava de você como você era. Muitos lhe admiravam.
O Jorel pôs as mãos na cabeça. Não entendia isso. Tudo que ele queria era ser igual a todo mundo. E o João disse assim:
- Sabe Joel: no fundo ninguém é igual a ninguém. Todos são diferentes. Por isso não dá pra ser igual a todo mundo.
- Mas eu só queria ser popular... – disse o Jorel.
- E você era popular – respondeu o João. – Você era tão popular que todo mundo queria ser como você, desenhar como você, actuar como você, fazer o que você fazia.
Aquilo era novidade. Quando o Jorel era Joel todos gostavam dele. Agora que era Jorel todos se afastaram dele.
O Jorel foi pra casa, almoçou e ficou no seu quarto pensando e pensando. Pensou e pensou até que tomou uma decisão.
No dia seguinte o Jorel não foi à escola. Mas o Joel foi: com seu cabelo de sempre, as velhas roupas e o caderno de desenho debaixo do braço. O pessoal notou e o comentário correu antes do sinal da entrada tocar.
Com o passar da manhã os antigos colegas foram se aproximando dele, falando com ele. E no recreio fez até fila de tanta gente que queria os desenhos do Joel.
Ali desenhando para os colegas, feliz da vida, o Joel só teve um pensamento. E foi:
“Adeus Jorel! Bem-vindo Joel!”.
“Goste de você mesmo e o mundo vai gostar de você.”
Baixar conto em Pdf: O menino que não queria ser ele mesmo - Emílio Carlos
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