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    maio 11, 2016

    O Menino do Dedo Verde - Maurice Druon


    No primeiro capítulo de “O menino do dedo verde”, lemos que o nome do protagonista é João Batista mas que, devido aos gritos de protesto do menino por ser assim chamado, as pessoas não conseguiam mais pronunciar seu nome e puseram-se a chamá-lo de Tistu (DRUON, 1994: 6). A partir deste capítulo, podemos notar a voz crítica e irônica do autor ao falar das idéias pré-fabricadas que os adultos têm e defendem, situação que se repetirá ao longo da narrativa.
    A seguir, temos a descrição física do garoto, seus pais e casa. Aquele tinha cabelos louros e crespos na ponta, olhos azuis e faces rosadas (Druon, 1994: 11). O pai, Sr. Papai, “tinha os cabelos negros cuidadosamente fixados com brilhantina; era alto e se vestia com apuro;  não se via grão de poeira na gola de seu paletó, e perfumava-se com água-de-colônia” (Druon, 1994: 12).
    A caracterização da mãe, Dona Mamãe, é feita comparando-a a flores: pele macia e unhas vermelhas, como rosas, e perfume de buquê (Druon, 1994: 12). Trata-se de uma família rica que morava em uma casa esplêndida com vários carros e cavalos de raça. No capítulo segundo somos apresentados a Ginástico, o pônei de quem o menino gosta muito.
    No capítulo três, somos levados a conhecer Mirapólvora, a cidade onde se passa a narrativa. O nome do lugar deve-se à fábrica de canhões do Sr. Papai que, pela linha de herança, viria a ser futuramente de Tistu. Ser comerciante de canhões, como nos informa Sr. Papai, é um negócio excelente uma vez que canhão sempre se vende, faça chuva ou sol.
    Tanto neste capítulo quanto no que o antecede, é expressiva a quantidade de vezes que o número nove aparece. Este intrigante detalhe foi objeto de pesquisa e concluiu-se que a presença do signo lingüístico nove, representa o do fim de um ciclo de idéias pré-fabricadas que acontecerá adiante na obra.
    A seguir, Tistu é mandado à escola, que freqüentou por três dias. Antes disso, Dona Mamãe havia ensinado-lhe os rudimentos da leitura, da escrita e do cálculo (Druon, 1994: 23). A escola produziu em Tistu um resultado imprevisível e lamentável. Quando começava o lento desfile das letras que caminham a passo pelo quadro-negro, quando começava a se desenrolar a monótona corrente dos três--vezes-três, dos cinco-vezes-cinco, dos sete-vezes-sete, Tistu sentia uma coceira no olho esquerdo e logo caía no mais profundo sono (Druon, 1994: 24).
    Por conta disso, no terceiro dia, o menino volta para casa com uma carta que dizia “(...) seu filho não é como todo mundo. Não é possível conservá-lo na escola” (Druon, 1994: 25). No dia seguinte, preocupado com a formação do filho, Sr. Papai decide experimentar um novo sistema de educação: as coisas e seu o funcionamento, seriam aprendidos a partir de observação no local onde elas se encontravam (Druon, 1994: 31-32).
    A primeira aula do sistema novo é, então, uma lição de jardim com o Sr. Bigode. Esse é quem descobre o polegar verde que dá nome à obra. Inicialmente, o jardineiro-professor é descrito com um velho macambúzio, de pouca conversa, e não muito amável (Druon, 1994: 35). Durante a aula, entretanto, Tistu descobre porque o jardineiro falava pouco com as pessoas: ele conversava, o dia inteiro, com as flores (Druon, 1994: 37). Ter o dedo verde é o poder fazer brotar as “(...) milhares e milhares de sementes que não servem para nada (...) esperando que um vento as carregue para um jardim ou para um campo. Muitas vezes elas morrem entre duas pedras, sem ter podido transformar-se em flor” (Druon, 1994: 39).

    O clima de entusiasmo gerado pela descoberta desse talento é desfeito no capítulo sete, do qual falaremos mais a seguir. Nele, confiam Tistu ao Sr. Trovões, que o leva à cadeia e lhe dá uma lição de ordem. Como conseqüência dessa visita, o menino tem um pesadelo. No sonho, Ginástico, o pônei, é um dos prisioneiros e, relinchava de dor após uma tentativa frustrada de fuga. Após acordar sobressaltado, Tistu começa a pensar que os prisioneiros sofreriam menos e se comportariam melhor se houvessem flores no lugar feio onde se encontravam. Na manhã seguinte, ninguém podia explicar como a cadeia da cidade se transformara em um castelo de flores (Druon, 1994: 54), exceto Bigode, que torna-se conselheiro de Tistu a respeito de quais plantas fazer brotar.
    No capítulo nove, a voz que sanciona os adultos aparece com mais força e dialoga com a obra “O pequeno príncipe”. Exupéry escreveu: “As pessoas grandes não compreendem nada sozinhas e é cansativo para as crianças, estar toda hora explicando” (Exupery: 8). No referido capítulo de Druon, lê-se: “As pessoas grandes têm a mania de querer, a qualquer custo, explicar o inexplicável” (Druon, 1994: 59).
    Movidos por essa mania, Mirapólvora é ocupada por jornalistas, fotógrafos e botânicos, que tentavam explicar como aquelas flores, resultantes da ação do polegar de Tistu, haviam crescido apenas em uma noite. Em sua declaração oficial, os pesquisadores “(...) falaram de condições atmosféricas particulares, de passarinhos que teriam deixado cair as sementes, e da excepcional fecundidade dos muros da cadeia, resultante de certo uso que os cães de Mirapólvora faziam deles” (Druon, 1994: 61). A seguir, Tistu recebe outra lição do Sr. Trovões. O professor o leva para conhecer as favelas, que chama de flagelo – uma desgraça que atinge muita gente ao mesmo tempo (DRUON, 1994: 66). Com isso, pretende mostrar a miséria, “(...) uma horrível galinha negra, de olhos ferozes (...), chocando continuamente horrendos pintinhos (...) havia o pinto-roubo (...); o pinto-embriaguez (...); o pinto-vício (...); o pinto-crime (...); o pinto-revolução, (...) o pior de
    todos” (Druon, 1994: 68). Com a visita de Tistu, os corredores da favela que antes eram horríveis, amanheceram belos e floridos. Com isso, a favela tornou-se ponto turístico e seus moradores passam a lucrar por cobrar a entrada dos visitantes. Dessa maneira, conseguem verba para construir um edifício com novecentos e noventa e nove apartamentos onde todos passaram a viver confortavelmente (Druon, 1994: 69).
    Na aula seguinte, Tistu visita o hospital, guiado pelo Dr. Milmales. Lá, conhece a menina doente, que vivia triste e sem esperança. O menino pensa, então: “Para esta menina sarar, (...) é preciso que ela deseje ver o dia seguinte. Uma flor, com sua maneira de abrir-se, de improvisar surpresas, poderia talvez ajudá-la... (...) Talvez esta menina esqueça a doença, esperando cada dia uma surpresa...” (Druon, 1994: 77).
    Mais uma vez, o menino faz uso de seu polegar verde e, com as flores que faz brotar, acaba com a tristeza da menina que se recupera em um curto espaço de tempo depois. No capítulo doze, o autor dirige-se ao leitor mirim que, por ventura, esteja questionando como os adultos não percebiam a ligação entre os lugares visitados por Tistu e as aparições misteriosas das flores. Também nesse capítulo, os membros da câmara municipal votam a mudança do nome da cidade para Miraflores, uma sugestão feita pelo Sr. Papai.
    A seguir, Dona Mamãe resolve levar o filho ao jardim zoológico. Lá, Tistu pondera que os animais deviam estar tristes e com saudade de suas casas. Também pensa que, ao serem transportados, trouxeram sementes de seus países. Essas, deviam estar espalhadas ao redor deles.
    Assim, mais uma vez, plantas surgem misteriosamente. Ao contrário das situações que a antecedem, a investida de Tistu no zoológico não causa comoção. As pessoas encontravam-se preocupadas com o estouro de uma guerra entre os Voulás e os Vaitimboras.
    Cabe ao Sr. Trovões explicar ao garoto as razões do conflito. Juntamente com a lição de geografia e de guerra, Tistu aprende e opina sobre a ideologia capitalista e o comércio:

    — Você está vendo este deserto? (...) Esse deserto não pertence a ninguém... (...) há algum tempo
    os Voulás anunciaram que queriam esse deserto; os Vaitimboras responderam que também queriam.
    (...)
    — O que é que há (...) nesse deserto? Jardins? — perguntou Tistu.
    — Claro que não, se é um deserto! (...) Eles querem o que está por baixo. (...) Petróleo.
    — Por que querem eles essa coisa chamada petróleo?
    — Para que os outros não o tenham. Querem esse petróleo porque o petróleo é indispensável numa
    guerra. (...)
    — O senhor é a favor de quem, Sr. Trovões? — perguntou Tistu (...)
    — Dos Voulás — gritou o Sr. Trovões. (...) — Porque são nossos amigos há muito tempo. (...)
    — Então esses canhões vão para os Voulás? — prosseguiu ele.
    — Só os da direita — gritou o Sr. Trovões. — O outro é para os Vaitimboras.
    — Como para os Vaitimboras? — exclamou Tistu indignado.
    — Porque eles também são bons fregueses. (....) É o comércio... — acrescentou o Sr. Trovões.
    — Pois então, eu acho abominável o seu comércio!
    (...) Uma vasta bofetada o interrompeu. O conflito entre os Voulás e os Vaitimboras acabava de se
    estender de repente até a face de Tistu (...) (Druon, 1994: 102-107).

    A aula termina aí, Tistu ganha um zero duplo e o professor comunica ao Sr. Papai a pouca indisposição do herdeiro com a fábrica. Naquela noite, Tistu voltou à fábrica e “aplicou” seu polegar. As plantas desabrocham, então, nos armamentos, que perdem sua eficácia. Por conta disso, a guerra deixa de acontecer. Os canhões fabricados em Mirapólvora, haviam atirado flores durante o combate. Uma situação boa para o mundo, mas desesperadora para o empresário Sr. Papai.
    Tistu acorda na manhã seguinte e, na sala de jantar, encontra o pai e Sr. Trovões conversando:

    — Uma ruína! Uma desonra! Só resta fechar! Quanto desemprego! exclamava o Sr. Papai.
    E o Sr. Trovões respondia (...):
    — Conspiração... Sabotagem... Atentado pacifista...
    — Ah, meus canhões, meus lindos canhões! — prosseguia o Sr. Papai (...)
    — Ah, se eu apanhasse o miserável que foi semear flores nos meus canhões!
    — Ah, se eu também o agarrasse! — respondia o Sr. Trovões.
    — Mas talvez não haja nenhum responsável... Forças superiores...
    — É preciso abrir um inquérito. É um caso de alta traição! (Druon, 1994: 121).

    Ouvindo isso, Tistu, corajosamente, assume a autoria desse e dos demais florescimentos. Sr. Papai, então, antes conhecido por sua capacidade de tomar decisões rápidas, passa uma semana refletindo sobre a situação. Por fim, decide transformar a fábrica de canhões em uma fábrica de flores, que se tornou um sucesso.
    Se estivéssemos lendo o último capítulo de “O menino do dedo verde”, poderíamos encerrá-lo, aí, com a frase “... e viveram felizes para sempre”. Entretanto, como adverte-nos o autor, as histórias nunca param onde a gente imagina (Druon, 1994: 135).
    Bigode, o jardineiro e conselheiro de Tistu, morre. Os adultos da narrativa (pai, mãe, criado, etc.) usam vários eufemismos para dar a triste notícia a Tistu; o que deixa o menino confuso. Sem saber se Sr. Bigode está descansando, fazendo uma viagem, se está embaixo da terra ou no céu, começa a construir uma escada:
    Começara por meter o polegar na terra, bem fundo, em dois pontos bem distantes um do outro, mais ou menos a distância dos seus braços bem abertos. (...) Duas árvores se ergueram, duas belas árvores esguias, de ramos espessos. Em menos de uma semana tinham atingido trinta metros. (...) Em breve mediam mais de cem metros. Nos dias de neblina já não se via mais onde acabavam. (...) 
    Para o menino, se o amigo estivesse no céu, aproveitaria a escada para descer, ao menos um pouco. Ele esperou por três dias. Como Sr. Bigode não descia, pôs-se a subir: Tistu ia subindo no mesmo ritmo, leve e ligeiro. Dentro em pouco sua camisola de dormir parecia menor que um lenço. (...) Tistu, de sua escada, via ainda a Terra. (...) E prosseguiu a escalada. Mas, em vez de se complicar, sua ascensão se tornava cada vez mais fácil. (...) Tistu não percebeu logo que já não havia escada. (...) Já não havia escada, e ele continuava a subir, sem dificuldade, sem fadiga. (...) E de repente ele entrou numa enorme nuvem, alva, sedosa, macia, onde já não enxergava mais nada. (...) Ouviu então uma voz, uma voz parecida com a de Bigode, mas imensamente mais forte, mais grave e mais profunda... E ouviu essa voz dizer:

    — Ah, você está aqui...

    E ele desapareceu para sempre naquele mundo invisível, do qual até as pessoas que escrevem
    histórias não sabem coisa alguma. (...) Quando os moradores da Casa-que-Brilha saíram aquela manhã a chamar Tistu por todos os cantos, viram no meio do prado dois chinelinhos e uma frase escrita em belas letras douradas:
    TISTU ERA UM ANJO! (Druon, 1994: 147-149). Assim o autor conclui seu este texto. Uma narrativa doce e atemporal que nos faz, como Tistu, refletir criticamente sobre nossa sociedade e, além, usar de talentos invisíveis para fazer alguma diferença. 

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